NEW CITY
“Como furar uma bolha, escapar de uma redoma? Sentir os pedaços da estrutura
vindo até você, como fragmentos de outras realidades que se chocam se dividem? Se
expor ao desconhecido? Questionar e duvidar da primeira referência criada de um
espaço, e inventar outras a partir do encontro? Construir caminhos, rotas e itinerários,
configurando movimento e energia? É possível nomear o sentimento do corpo sendo
preenchido por um território?”
- Nota de caderno de campo, 2020.

Em 2016 iniciei o contato com produções artísticas ligadas à intervenção urbana, o
graffiti e a pixação. Essa aproximação me levou a observar mais profundamente a rua
e o espaço público enquanto campo artístico e político prolífico, e mais
especificamente, a entrar em contato com o meu entorno e território de origem, o
bairro da Cidade Nova, no qual nasci e residi até o ano de 2020. Começo então a fazer
caminhadas e deambulações pelo bairro em que cresci e onde vive hoje parte
significativa de meus parentes. A câmera fotográfica apresenta-se, nesse sentido,
como elemento de aproximação dos sujeitos que encontro nos trajetos traçados em
minhas incursões na paisagem local.

A Cidade Nova é um bairro histórico e popular, território que se encontra situado no
miolo da cidade, caracterizado por ser um bairro periférico, embora mantenha relação
com áreas mais centrais da cidade. O bairro possui instituições históricas de
relevância como por exemplo o Arquivo Público do Estado da Bahia e o Cemitério
Quinta dos Lázaros, definido como o primeiro cemitério da cidade de Salvador.
Embora historicamente a cidade tenha a fotografia como seu principal meio de
representação e propaganda turística, muitos bairros a-margem carecem de materiais
que deem conta de representá-los. Nesse sentido, as minhas caminhadas pelo bairro
e meu desejo de registrá-lo, vai na contramão dessa ausência de representação.
Desde então, como morador-artista construí repertório imagético do bairro e seus
moradores através da fotografia, sobretudo analógica, produzindo recorrências
temáticas sobre o cotidiano de vizinhos, trabalhadores, e transeuntes, concomitante à
minha descoberta individual do valor histórico que o bairro carrega em si. Partindo
desse processo de trabalho fundador enquanto artista visual, em 2019 desenvolvi a
exposição “New City”, como parte da programação na Virada Sustentável de Salvador.
Esta exposição consistiu em um processo de dois dias de colagem de lambes, em
diferentes pontos do território, conectados a partir do local em que a foto foi feita e
colada. No total foram produzidos 8 paineis, que apresentam desde retratos a cenas
cotidianas, as quais são experienciadas como parte da dinâmica dos moradores.
Através dessa experiência, eu percebi que a inter-relação dos sujeitos com as
imagens dispostas em muros, quadras, fachadas de estabelecimentos e casas, trazia
questionamentos sobre o papel das imagens fotográficas nas representações desses
indivíduos e nos usos das superfícies e equipamentos públicos que compõem o
bairro, e também sobre o meu próprio papel na qualidade de fotógrafo baiano que
nasceu nesse lugar. Desde então, venho trabalhando com a pergunta: de que modo o
desenvolvimento do New City representa/re-significa o território enquanto potência
de produção artística e re-imaginação das políticas de memória?
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